domingo, 15 de abril de 2012

Tranqueira na Bagagem: O Eu que Ninguém Nunca Viu



Vou ser sincero...
Antes de começar a contar tudo o que a ETED significou na minha vida, creio que é importante que você - leitor desta coluna - entenda quem entrou naquele prédio no dia 16 de marco de 1992. Para isso, quero contar algumas histórias que marcaram a minha vida e me fizeram ser quem eu era até aquele dia.

O Travesso 

Sempre fui travesso desde muito jovem. No meu caso, a minha travessura era a minha maneira de conseguir a atenção que eu não tinha em casa, principalmente do meu pai. Aos sete anos de idade eu estava esperando por minha mãe enquanto uma amiga sua experimentava seu vestido de noiva (no dia de seu casamento). Segundos antes da noiva sentar-se ao meu lado, tirei o chiclete da boca e o coloquei na cadeira... Assim que alguém notou o chiclete no vestido, imaginem o que aconteceu. Há apenas algumas horas da cerimônia do seu casamento, lá estava a noiva em pânico total enquanto a mulherada corria desesperadamente em busca de uma maneira de salvar o vestido, enquanto eu e meu irmão fingíamos que não sabíamos de nada. Muitos anos depois confessei meu pecado a minha mãe.


Eu (7)

Mas a pior de todas as travessuras aconteceu em uma excursão ao Museu do Ipiranga em São Paulo. Por alguma razão que até hoje eu não consigo entender porque, eu entrei em várias carruagens em exposição no museu. Carruagens raríssimas da época dos Dom Pedros. Também subi em uma Pia Batismal, onde o Padre Anchieta batizou crianças indígenas quando chegou no Brasil em 1554... A professora ficou sabendo e jurou que jamais me levaría em outra viagem da escola.


O Mentiroso


A mentira é um inimigo feroz com quem luto incessantemente, diariamente. Mas nem sempre foi assim. Por muitos anos eu abracei a mentira como um verdadeiro subterfúgio. Por mais elaborada que fosse a mentira, havia uma pessoa que eu era incapaz de enganar: minha mãe. A mentira foi a maneira de lidar com meus temores, passar a impressão de que eu era quem eu queria ser. A mentira foi a maneira de colocar as atenções sobre mim. A mentira foi a maneira de sair de situações delicadas. A mentira foi a maneira de sair de relacionamentos desgastados, mas também a maneira de me manter em vários de uma só vez. Em um determinado momento da minha vida, eu namorei três meninas de uma so vez por um período de um pouco mais de três meses: tudo na base da mentira. Mentí até que não pude mais viver com a mentira. Cansei e terminei o namoro com todas.


O Ladrão
Tem um ditado que diz que "a miséria adora uma má companhia..." Além de mentiroso eu também era ladrão. Roubava dinheiro dos meus pais desde os nove anos de idade. Aos 13 comecei a roubar dinheiro de uma família de vizinhos que moravam próximos da minha casa. Eu tinha liberdade total de entrar para brincar com meu amigo e por coincidência descobri onde o dinheiro da casa era guardado. Foram meses roubando daquela família, até que de alguma maneira fui pego. Olhando para trás vejo que o pior de tudo foi que eu sinceramente os amava e que os meus atos praticamente colocaram um ponto final naquela amizade de infância.  Graças à Deus alguns anos depois a amizade foi restaurada e guardo muito carinho por eles. Também aprecio muito o perdão que eles me estenderam.


                                                      As Drogas 
Usei o que estava disponível numa época quando o pior de tudo era a cocaína. Cheirei cocaína dentro da Ford no final do meu turno de trabalho. Felizmente nunca coloquei um centavo do meu dinheiro na droga.  Apesar de ser um imbecil, eu ainda me preocupava com o que as consequências do uso das drogas na minha família. Meus pais ficariam devastados se eu desse uma pisada na bola e fosse pego com drogas. Dou graças a Deus também a Janaína, minha namorada na época em que o mundo das drogas se fez disponível para mim. Ela também foi uma influencia muito positiva na minha vida neste sentido.

O Sexo
Eu vivia em um mundo de fantasias sexuais desde os 13 anos de idade. Eu não descobri a gravidade da minha situação até que eu sai do Brasil e optei pela abstinência. Não entendo a extensão da minha dependência emocional e psicológica, mas com o passar dos anos, muito do meu tempo, dos meus recursos e das minhas energias era voltado para satisfazer minha necessidade sexual. Arlete Gavranic, educadora e terapeuta sexual, explica que "o compulsivo vira escravo da necessidade de sexo. Não necessariamente o sexo vivido dentro do contexto de uma relação amorosa e íntima, onde exista prazer por estar com alguém. O vicio em sexo é extremamente egoísta e implica no desenvolvimento de uma vida dupla onde suas ações são mantidas em sigilo." Mas a coisa poderia ter sido muito pior se eu tivesse me envolvido com pornografia. Meus pais nunca permitiriam materiais pornográficos em casa - eu respeitei. A pornografia impede que o homem possa jamais experimentar a verdadeira intimidade. Outra coisa pela qual hoje dou graças a Deus por jamais haver me envolvido é o homossexualismo. Em um determinado momento da minha adolescência, ter uma relação homossexual era coisa para "comedor," pois "comedor come o que passa pela frente..." mas eu não cai nessa, achava e acho nojento.


Independência ou Morte!
Aos 18 anos pedi minha emancipação, ou seja, que meus pais assinassem em cartório minha independência e me dessem os direitos que somente alcançaria aos 21 anos de idade. Como disse antes, nunca pedi permissão para sair do Brasil - simplesmente avisei que estava indo embora dentro de 12 meses. Como é que os meus pais me aguentaram? Realmente não entendo.


Religião Não
Cresci católico. Fui coroinha no Convento Santa Clara (onde ganhei o apelido de Anjinho) até a minha adolescência quando fui seduzido pela vida de pecador assumido. Na mesma época, meus pais se converteram a Igreja Evangélica e as coisas que aprendi na convivência com meus pais, me levaram a rebelar-me contra a Igreja Católica. Por anos fui anti-religião,  pois era a maneira mais fácil de fazer o que eu queria fazer sem ter que prestar contas dos meus atos à Deus. Por outro lado, minha visão de crente em 1992 era a do típico Assembleiano do início dos anos 90: Não pode jogar futebol, não pode usar shorts, não pode assistir televisão, não pode - não pode - não pode!


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Anos depois, em uma das viagens de regresso ao Brasil, um vizinho de muitos anos conversava comigo no portão de sua casa e me disse algo que me marcou profundamente. Ele me disse: "- Adriano, eu não dava um centavo por você. Para mim, você era um caso perdido, sem futuro nenhum na vida. Mas hoje você é um verdadeiro vencedor e eu tenho orgulho de você." O Toninho da Lucila não faz idéia do quanto aquelas palavras marcaram a minha vida - para sempre - porque o que ele disse era a mais pura verdade: eu possuía um potencial tremendo para me meter em encrencas. Estava realmente em rota de destruição. Mas sim haviam alguns fundamentos bons em mim, pela educação dada por meus pais, o que incluía religião.  Mais tarde fui descubrir que a religião tinha pouco a me oferecer...

Quando sai do Brasil rumo a Espanha levei comigo esta bagagem e quando entrei na JOCUM para fazer a ETED, pouco a pouco essas tranqueiras foram saindo a luz...






9 comentários:

  1. ..somos mais parecidos do que só aparência física.
    Adorei saber todas essas coisas sobre você, primo. O mais legal de tudo é a forma de você escrever sem ter vergonha alguma do que fala. Parabéns. Passei a te admirar depois dessa.

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    1. Obrigado pelo incentivo. Nao foi facil me expor, mas resolvi que assim vai ser. Sem contar das minhas caídas, eu ficaria parecendo um santo - santo de pau oco! Nao quero. Sei que a impressão que ficou foi a de que depois que eu sai do Brasil fiquei perfeito - principalmente porque eu estava na JOCUM - mas nao foi assim e quero que saibam. Obrigado mesmo.

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  2. Hey Adriano, uma coisa que aprendi é que o inimigo odeia o que está na luz, ele gosta de tudo que está escondido. Aquilo que a gente faz e não tem coragem de admitir é o preferido dele. Portanto, assim que trazemos à tona tudo o que está na escuridão, começa-se uma fase onde o inimigo também começa a perder terreno nas nossas vidas. Parabéns a vc pela coragem de se expor. Que tudo isso seja usado para a glória DELE.

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  3. Marli - Vc tem toda razão. Tenho experimentado isto na minha vida a anos e ainda assim, me custa muito ser transparente com minhas debilidades. O homem tem a necessidade de ser respeitado, dai o temor de se fazer vulnerável. Como eu respondi ao Rafael, não teria sentido para mim esconder minhas falhas - as historias perderiam seu sentido e roubaria a gloria de Deus.

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  4. Oi Dri,
    Engraçado, quando você era um "capetinha" eu costumava te chamar de Anjinho... E de uns tempo pra cá só consigo te chamar de Dri... rs. Mas tudo bem!
    Bem, falando do post, eu te conheço há tantos anos e pensava que sabia tudo de você... Mas lendo este post me surpreendi! Quanto à travessura do vestido, tranquilo, coisa de moleque querendo realmente chamar atenção... Quanto a sua fase de Dom Juan, eu acompanhei de perto e não é nenhuma novidade... Assim como a sua resistência à religião naquele tempo. Agora, quanto aos roubos e ao uso de cocaína, isso eu não sabia... E fico feliz que não tenha se tornado um viciado em nenhum dos dois casos! Já em relação à mentira, acho que você se refere aos malabarismos que fazia para administrar as diversas namoradas... rs, não que você fosse completamente desonesto. Porque isso eu tenho certeza que você nunca foi! Prova disso é a nossa amizade, de tantos anos, que sempre foi baseada na sinceridade!
    Dri, apesar de todo o seu esforço para chamar atenção dos seus pais, ou melhor, do seu pai, como você disse, eu tenho certeza que eles sempre aguentaram tudo porque acima de tudo eles te amam, e sempre te amaram, incondicionalmente. E porque, querendo ou não, você é um cara especial!!! Para eles e para mim!!
    Dri, quando eu te convidei para participar deste blog eu pensei que seria interessante você dividir sua bagagem cultural, por ter viajado por tantos países, mas não imaginei que você fosse expor, com tamanha intimidade, as suas experiências pessoais... Isso só mostra o quanto você cresceu com tudo isso! O que me faz te admirar ainda mais a cada dia!!!
    Te ADORO, meu amigo! Parabéns!!!
    Grande beijo!

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    1. Querida Lu,
      Interessante seu comentário, pois vc que o conhece há tanto tempo tem uma noção maior do que o ele escreve. Isso lhe dá talvez uma curiosidade a mais para ler os textos, não?
      Agora, um pequeno comentário sobre a mentira. Infelizmente vemos a mentira como algo não tão relevante. Se ninguém foi ferido, se foi uma brincadeira, o peso é menor. Na verdade, não existe mentirinha ou mentirona, tudo é mentira. O meu problema por exemplo é aumentar ou diminiur uma história/situação. Não importa se minha história tem 1% de mentira ou 90%. Será que tomaríamos um copo de água com 1% de água contaminada?
      Hey, acho que tive uma idéia para um post da semana que vem.
      Bjs querida amiga!

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    2. Como eu escrevi na conclusão do post, havia naquele Adriano um alicerce de valores que vieram dos meus pais. Da mesma forma que as vezes olho para tras e vejo as idiotices que fiz, também vejo algumas coisas boas que também me surpreendem. Por exemplo, houve uma situação especifica onde eu me recusei a fazer sexo com uma namorada porque ela era virgem... de onde saiu esta bondade no meio de tanta tranqueira? Em amizades como a nossa (Lu), eu dei meu melhor. Vc conheceu o melhor de mim.

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  5. Lu - as minhas experiencias culturais nestes últimos 20 anos seriam mera curiosidade se o leitor não conhece o cara que esta interpretando essas experiências. Tudo o que eu contar vai ser uma questão de perspectiva... mas perspectiva de quem? Em um determinado momento houve uma transformação muito brusca em algumas áreas da minha vida, outras ainda estão em processo. Escrever tem sido um desafio pois sei que tenho que fazer uma escolha entre escrever as coisas como são ou escrever para "Inglês ver." Assim que ta indo tudo junto. Escrever tem sido muito bom pois vejo como as coisas eram diferentes do que são. No final a percepção que deve ficar e' de que o Adriano nada e' - as coisas fantásticas que aconteceram não tiveram nada a ver comigo, mas que Deus fez a diferença a todo momento porque Ele foi e e' o ator principal no teatro da minha vida.

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  6. Oi Adriano, esqueci de dizer que ameio o vestido da noiva (parecido com o meu). Quem fez o desenho? Aliás todos os desenhos foram muito bem escolhidos. Muito interessante o do texto independência ou morte com a vaca indo pro brejo. Clever!

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